Um amparo chamado comida:
a obesidade à luz da psicossomática e da psicanálise
Palavras-chave:
nutrição, obesidade, psicanáliseResumo
O culto ao corpo perfeito, à beleza e ao narcisismo, característica da sociedade atual, é relacionado à magreza. A obesidade e o sobrepeso surgem como estigma de vergonha, evidenciando horror, feiura e rejeição. Diante de um evento traumático, qualquer sujeito se vê com poucos recursos simbólicos que neutralizem esse excesso. Para alguns, o conflito psíquico encontra apenas uma saída para percorrer fora do psiquismo: o retorno desse excesso ao Real do corpo, o engordando. Nesses, o excesso está relacionado ao desamparo frente ao signo da falta do Outro, o que os faz utilizar um objeto real – a comida – na mesma proporção em que há um aumento da falta. A alimentação na contemporaneidade valoriza uma objetiva nutrição do corpo, anulando o prazer que o ato de comer traz. Dessa forma, a obesidade aponta para um além do nutrir. No CLINEX, clínica multidisciplinar que atende pacientes com hipertensão e doenças associadas, o Serviço de Psicologia estuda o fenômeno do engordar e proporciona ao sujeito obeso uma percepção da relação de ausência do Outro nele, produzindo uma simbolização para poder modificar sua relação com o alimento. Para isso, não buscamos instruir sobre a alimentação do paciente nem controlar seu peso, mas, sim, entender e escutar sua história de vida, almejando elaborar seus impasses e seu desamparo. Os estagiários, antes de atender os pacientes, passam por quatro meses de rigoroso treinamento prático semanal e simulação de casos clínicos bem como por estudo de textos importantes acerca da psicanálise e psicossomática que não são abordados durante a formação acadêmica regular. Findo esse tempo, as discussões de texto continuam e começam as supervisões dos casos atendidos. Em dois anos de projeto, cada estagiário, triou e/ou atendeu cerca de 15 pacientes no Serviço. Com a finalização do atendimento, observa-se, na maioria dos pacientes, uma redução significativa de sua massa corporal, pois ocorre uma pluralização de meios de se obter e realizar os prazeres da vida que, antes, estavam restritos à comida. O sujeito torna-se mais independente, sem depositar no outro a expectativa de se amparar.